Segurança do trabalho para autônomos: cuidados essenciais
A contratação de terceiros é uma prática comum no mercado atual, impulsionada por fatores como especialização de serviços, redução de custos operacionais e aumento da flexibilidade organizacional.
Dentro desse modelo, a figura do trabalhador autônomo tem ganhado destaque, especialmente em setores que demandam prestação de serviços técnicos ou especializados de forma pontual. No entanto, a contratação de autônomos requer cuidados específicos, principalmente quando falamos sobre Segurança e Saúde no Trabalho (SST).
Engana-se quem pensa que a ausência de vínculo empregatício isenta o contratante de qualquer responsabilidade sobre a integridade física do prestador de serviço. Ainda que o trabalhador atue de forma independente, a empresa contratante pode ser responsabilizada por acidentes ou doenças ocupacionais ocorridas durante a execução da atividade. Por isso, é essencial que a gestão de terceiros considere os riscos envolvidos também nessas contratações.
Perfil do autônomo e desafios para a segurança do trabalho
O trabalhador autônomo é aquele que exerce uma atividade profissional de forma habitual, sem subordinação hierárquica, assumindo os próprios riscos da sua atuação. Ele pode ser uma pessoa física ou jurídica, a depender da formalização escolhida. As modalidades mais comuns incluem o profissional liberal autônomo e o Microempreendedor Individual (MEI).
É fundamental compreender que a simples ausência de vínculo formal não basta para descaracterizar uma relação de emprego. Se houver subordinação, pessoalidade, onerosidade e habitualidade, ainda que o profissional seja denominado “autônomo”, o vínculo empregatício pode ser reconhecido judicialmente.
Do ponto de vista da Segurança do Trabalho, isso significa que, quanto mais a atuação desse trabalhador se assemelhar à de um empregado regular — inclusive com ordens diretas, controle de jornada e uso contínuo de recursos da contratante —, maior será o risco jurídico para a empresa.
Portanto, é imprescindível que a contratação de autônomos seja feita de forma criteriosa, com atenção não apenas à natureza jurídica da relação, mas também aos riscos ocupacionais envolvidos.
SST: obrigações do contratante com autônomos
Constituição Federal, no artigo 7º, inciso XXII, estabelece que é dever do empregador a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”. Embora o texto se refira ao empregador, sua aplicação prática tem sido estendida àqueles que contratam serviços, inclusive de autônomos, especialmente quando a atividade envolve riscos à integridade física do trabalhador.
A Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), que trata das disposições gerais e do Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO), afirma que todos os empregadores e contratantes de serviços são responsáveis por assegurar um ambiente de trabalho seguro. Isso inclui a comunicação dos riscos associados às atividades, a disponibilização de informações sobre medidas de prevenção aplicáveis ao ambiente de trabalho e a inclusão do profissional nas políticas internas de segurança, quando sua atuação ocorrer nas dependências da empresa. Essas práticas reforçam a cultura de prevenção e contribuem para mitigar responsabilidades em caso de incidentes.
Além disso, o Código Civil (artigos 186 e 927) prevê que todo aquele que, por ação ou omissão, causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito e deve repará-lo. Ou seja, mesmo sem um vínculo empregatício formal, o contratante pode ser responsabilizado civilmente por um acidente ocorrido com o autônomo.
Em contextos de fiscalizações ou ações trabalhistas, também pode haver responsabilização solidária ou subsidiária, especialmente se for comprovado que a empresa deixou de adotar medidas básicas de prevenção.
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Avaliação de riscos na segurança do trabalho de autônomos
A gestão de risco eficaz começa na identificação dos perigos envolvidos nas atividades que serão terceirizadas. Muitas vezes, empresas negligenciam esse passo sob a falsa premissa de que, por se tratar de um autônomo, o controle dos riscos é de responsabilidade exclusiva dele. Isso é um erro.
Independentemente do regime contratual, se o serviço será prestado dentro das instalações da empresa contratante ou em nome dela, a organização deve avaliar:
- Quais atividades o autônomo realizará;
- Quais ferramentas, máquinas e insumos utilizará;
- Se o ambiente de trabalho apresenta condições insalubres, perigosas ou com potencial de acidentes;
- Qual o nível de exposição a agentes físicos, químicos ou biológicos;
- Qual a necessidade de uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) ou Equipamentos de Proteção Coletiva (EPC).
Essas informações podem ser incorporadas ao Inventário de Riscos, mesmo que em seção separada dos empregados formais. Além disso, essa análise subsidia a decisão sobre a viabilidade da contratação, a elaboração do contrato de prestação de serviços e os documentos acessórios, como termos de ciência de risco e comprovantes de entrega de EPIs.
A omissão dessa etapa pode levar a sérias consequências legais, especialmente em caso de acidentes com lesão grave ou fatalidade.
Segurança do trabalho para autônomos: boas práticas
Implementar boas práticas de segurança na contratação de autônomos não apenas fortalece a cultura de prevenção da empresa, como também demonstra diligência e responsabilidade jurídica. Algumas medidas que podem (e devem) ser adotadas incluem:
a) Capacitação e orientação técnica
Como medida preventiva e alinhada à gestão responsável de terceiros, recomenda-se que, antes do início das atividades, o autônomo receba informações claras sobre os riscos associados ao serviço e as medidas de prevenção adotadas pela empresa. Isso pode ser feito por meio de orientação técnica ou integração simplificada, de forma a promover a conscientização do prestador e resguardar a contratante.
b) Fornecimento de EPIs
Quando a atividade contratada envolve riscos que exigem o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), é recomendável, como boa prática de prevenção, que a empresa contratante forneça os equipamentos necessários, especialmente quando o serviço for executado em suas dependências ou sob condições por ela controladas. Embora a NR-06 se aplique diretamente aos trabalhadores celetistas, estender essa prática aos autônomos demonstra diligência preventiva e reforça o compromisso com a integridade física de todos os envolvidos. Nesses casos, é prudente formalizar o fornecimento por meio de registro documental, com assinatura do autônomo em um termo de recebimento e responsabilidade quanto ao uso adequado dos EPIs.
c) Formalização de documentos
Um contrato de prestação de serviços bem estruturado pode incluir cláusulas relacionadas à segurança do trabalho, mesmo que não sejam legalmente exigidas para contratações de autônomos. Incluir termos de ciência sobre riscos, orientações preventivas e responsabilidades quanto ao uso de EPIs, por exemplo, são boas práticas que reforçam a diligência da empresa na gestão dos riscos envolvidos.
d) Participação em integração de segurança
Sempre que possível, o autônomo deve ser incluído nos processos de integração de segurança da empresa, especialmente quando sua atividade for realizada internamente. Isso reforça o alinhamento com a cultura de prevenção da organização.
Essas boas práticas reduzem significativamente o risco de acidentes, fortalecem a imagem da empresa e mitigam possíveis disputas judiciais em caso de incidentes.
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Monitoramento da segurança do trabalho de autônomos
Um dos grandes desafios na contratação de autônomos é encontrar o equilíbrio entre o controle necessário para a segurança e o respeito à independência técnica do profissional. Monitorar a execução do serviço, garantir que normas de segurança sejam cumpridas e, ao mesmo tempo, não caracterizar subordinação direta, exige estratégia. Algumas ações que podem ser implementadas incluem:
a) Acompanhamentos periódicos
Realizar inspeções pontuais ou observações de segurança para verificar o uso correto de EPIs, a adoção de medidas preventivas e a conformidade com os padrões definidos no contrato. É importante que esse acompanhamento seja registrado, mas sem exigir ordens diretas que possam caracterizar subordinação.
b) Sistema de comunicação de incidentes
Disponibilizar um canal para que o próprio autônomo possa comunicar incidentes, quase acidentes ou condições inseguras é uma forma eficiente de envolvê-lo na gestão de riscos, promovendo corresponsabilidade.
c) Avaliações de desempenho com foco em segurança
Ao final da prestação de serviço, é possível avaliar o cumprimento das exigências contratuais relacionadas à segurança. Esse feedback pode ser utilizado para futuras contratações ou como base para revisão de procedimentos internos.
d) Registro e análise de não conformidades
Caso o autônomo descumpra medidas de segurança previamente estabelecidas em contrato ou acordos complementares, é recomendável que a empresa registre a ocorrência e avalie a adoção de ações corretivas proporcionais, que podem incluir desde orientações adicionais até a rescisão contratual, conforme a gravidade do caso. Essa conduta demonstra zelo preventivo e responsabilidade na supervisão de serviços terceirizados.
Essas práticas promovem um ambiente mais seguro sem comprometer a autonomia técnica do prestador de serviço.
A gestão de riscos em contratos com trabalhadores autônomos exige atenção redobrada das empresas que desejam garantir conformidade legal e promover ambientes de trabalho seguros. Ao integrar esses profissionais às estratégias de SST, a organização não apenas reduz a probabilidade de acidentes e doenças ocupacionais, mas também fortalece sua postura preventiva e ética no mercado.
É fundamental compreender que o compromisso com a Segurança do Trabalho vai além das obrigações legais. Trata-se de uma prática que protege vidas, reduz passivos e gera valor sustentável para todas as partes envolvidas. Empresas que adotam medidas proativas em relação aos autônomos demonstram maturidade na gestão de riscos e respeito à integridade física dos profissionais com os quais se relacionam — independentemente do regime de contratação.
Como a Bernhoeft pode ajudar?
A Bernhoeft é uma empresa líder na Gestão de Terceiros. Contamos com uma equipe especializada, que realiza a análise e a gestão documental relacionadas à Saúde e Segurança do Trabalho. Sempre alertas às atualizações normativas, realizamos a análise documental a fim de verificar a conformidade de acordo com as legislações pertinentes. Se você busca a conformidade dos documentos dos trabalhadores terceiros com segurança, expertise e agilidade, entre em contato conosco.
Autora: Daniela Siqueira | Analista de Gestão de Terceiros na Bernhoeft
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