Riscos e conformidade em atividades em espaços confinados
Os trabalhos em espaços confinados estão entre os mais críticos no campo da Segurança e Saúde no Trabalho (SST). São ambientes que reúnem características físicas e operacionais capazes de potencializar riscos graves, como asfixia, intoxicação, explosão e dificuldade de resgate.
Tanques, silos, galerias subterrâneas e tubulações são exemplos típicos, mas a diversidade desses espaços exige cuidado redobrado das empresas que contratam e das prestadoras de serviço responsáveis por executar atividades nesses locais.
A NR-33 estabelece os parâmetros legais de segurança e saúde para o trabalho em espaços confinados, mas a conformidade regulatória não se resume à aplicação literal da norma. No contexto da terceirização, a gestão de riscos deve ser encarada como um processo integrado que envolve contratantes, prestadores, trabalhadores e equipes de emergência, todos com papéis definidos, responsabilidades jurídicas e deveres práticos.
A seguir, analisamos os principais aspectos que estruturam essa gestão: definição e classificação dos espaços, responsabilidades legais, capacitação obrigatória, análise documental e boas práticas que fortalecem tanto a prevenção de acidentes quanto a segurança jurídica das organizações.
Definição e classificação atividades em espaços confinados
De acordo com a NR-33, espaço confinado é todo ambiente não projetado para ocupação humana contínua, que apresente meios limitados de entrada e saída e ventilação insuficiente para garantir condições atmosféricas seguras.
Essa definição é importante porque, muitas vezes, ambientes aparentemente inofensivos podem ser caracterizados como espaços confinados em razão de suas condições operacionais. Um tanque aparentemente vazio, por exemplo, pode conter vapores inflamáveis residuais que representam risco de explosão.
A classificação desses espaços não se limita à sua forma física, mas envolve também a identificação dos riscos potenciais: deficiência ou enriquecimento de oxigênio, presença de gases tóxicos, risco de soterramento, dificuldade de evacuação e limitações de comunicação.
Reconhecer corretamente essas características é o ponto de partida para toda a estratégia de prevenção. Além disso, a correta classificação impacta diretamente nas medidas de controle exigidas, no nível de capacitação dos trabalhadores e na necessidade de recursos adicionais, como ventilação mecânica ou equipamentos de resgate.
Na prática, exemplos de espaços confinados estão presentes em diversos setores da economia. Na indústria, destacam-se tanques de armazenamento, reatores e vasos de pressão. No agronegócio, silos de grãos e caixas subterrâneas de irrigação representam riscos significativos.
No setor de saneamento, é comum o trabalho em galerias de esgoto, poços de visita e tubulações de grande diâmetro. Já na construção civil, há atividades em fundações profundas, escavações e tubulões pneumáticos. Mesmo em ambientes hospitalares ou laboratoriais, autoclaves de grande porte e câmaras de esterilização podem ser enquadrados como espaços confinados.
Esses exemplos demonstram que a caracterização não depende apenas do ramo de atividade, mas sim das condições estruturais e atmosféricas que podem transformar um ambiente aparentemente seguro em um espaço de alto risco.
Responsabilidades legais do contratante e do prestador de serviço
A gestão de riscos em espaços confinados é uma responsabilidade compartilhada, mas com papéis distintos. O contratante, ao demandar serviços terceirizados em tais ambientes, deve garantir que a atividade só seja executada por empresas que comprovem a capacitação de seus trabalhadores, apresentem toda a documentação obrigatória e estejam aptas a cumprir as exigências legais.
Também cabe ao contratante fornecer informações detalhadas sobre o ambiente de trabalho, riscos existentes e medidas de controle, além de fiscalizar o cumprimento das obrigações pela prestadora.
Já a empresa prestadora de serviços tem o dever de realizar a análise de riscos específica para cada atividade, elaborar procedimentos operacionais, disponibilizar equipamentos adequados e capacitar os trabalhadores. Deve, ainda, emitir a Permissão de Entrada e Trabalho (PET) para cada intervenção, designando vigias e supervisores de entrada que acompanharão a atividade.
Em caso de acidente, a responsabilização costuma ser solidária. Isso significa que tanto contratante quanto contratado podem responder civil, trabalhista e até criminalmente. A legislação previdenciária (Lei nº 8.213/1991) e a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho reforçam essa corresponsabilidade, exigindo do contratante diligência na escolha e na fiscalização da prestadora.
Assim, não basta transferir a execução: é necessário adotar mecanismos de controle e monitoramento contínuos para evitar falhas que possam resultar em passivos jurídicos e danos irreparáveis.
Capacitação e certificação obrigatória de trabalhadores
A capacitação é um dos eixos centrais da NR-33. Ela estabelece treinamentos obrigatórios para trabalhadores autorizados e vigias, com carga mínima de 16 horas, além de formação específica para supervisores de entrada, com 40 horas. Todos devem passar por reciclagem anual de, no mínimo, 8 horas.
Mas a conformidade não se restringe a esses treinamentos. A ABNT NBR 16710 introduziu requisitos detalhados para capacitação de equipes de emergência e salvamento em espaços confinados.
Essa norma estabelece diferentes níveis de treinamento, que vão desde o resgatista industrial e operacional até funções de maior responsabilidade, como líder e coordenador de salvamento. Tais treinamentos são essenciais porque, em uma situação de emergência, não é suficiente contar apenas com trabalhadores autorizados: é necessário que existam profissionais devidamente preparados para realizar resgates técnicos, utilizando equipamentos de pré-engenharia e simulando situações reais de risco.
Quanto aos certificados, é importante observar que a legislação traz exigências distintas. Para os treinamentos previstos na NR-1 e NR-33, o certificado deve conter, no mínimo: nome e assinatura do trabalhador, carga horária, data ou período de realização, local, conteúdo programático, identificação e qualificação dos instrutores, além da assinatura e registro profissional do responsável técnico.
Já para os treinamentos de resgate previstos na NBR 16710, o nível de detalhamento é ainda maior, incluindo CPF de instrutores e alunos, validade do curso, CNPJ do provedor de treinamento, equipamentos utilizados durante a prática, declaração de aproveitamento e número de rastreabilidade do certificado, dentre outras informações.
Esses requisitos reforçam a necessidade de atenção no processo de análise documental, já que certificados incompletos ou genéricos podem ser considerados inválidos em auditorias ou fiscalizações.
Documentação e análise documental como ferramenta de mitigação de riscos
A análise documental cumpre papel decisivo na prevenção de acidentes e na proteção jurídica das empresas. Antes mesmo de iniciar a atividade, é preciso verificar se todos os documentos obrigatórios estão atualizados e em conformidade.
O PGR (Programa de Gerenciamento de Riscos), que substituiu o antigo PPRA, tem como objetivo identificar, avaliar e controlar os riscos presentes no ambiente de trabalho, incluindo aqueles associados a espaços confinados.
O PCMSO (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional), por sua vez, deve ser elaborado a partir das informações do PGR e tem como finalidade definir e direcionar os exames complementares necessários, de acordo com os riscos ocupacionais identificados.
Já os ASOs (Atestados de Saúde Ocupacional) comprovam, individualmente, a aptidão clínica dos trabalhadores para exercer atividades críticas, assegurando que somente pessoas devidamente avaliadas e consideradas aptas estejam expostas a esse tipo de risco.
Além disso, devem ser analisados os certificados de capacitação (NR-33 e NBR 16710, quando aplicável), as fichas de entrega de EPI previstas na NR-6, as permissões de entrada e trabalho (PETs) e registros de simulados de emergência.
A verificação detalhada desses documentos permite ao contratante barrar preventivamente situações de não conformidade, como um trabalhador sem aptidão médica ou com certificado vencido. Esse controle não apenas mitiga riscos de acidentes, mas também fortalece a posição jurídica da empresa em caso de fiscalização ou litígio.
Boas práticas para prevenção de acidentes e segurança jurídica
Cumprir a legislação é obrigatório, mas adotar boas práticas é o que diferencia empresas que apenas atendem às exigências mínimas daquelas que efetivamente constroem uma cultura de segurança. Entre essas práticas, o planejamento detalhado é o ponto de partida: cada atividade deve ser precedida de uma análise preliminar de riscos e da emissão de uma PET específica.
Na sequência, deve-se adotar um check-list documental rigoroso, validando certificados, ASOs, fichas de EPI e demais documento obrigatórios vinculados à exposição ao risco. Com os documentos validados, a equipe deve passar por treinamentos de segurança em espaços confinados e simulações de emergência, garantindo que todos saibam como agir em caso de acidente.
Durante a execução, o monitoramento atmosférico contínuo deve ser realizado para assegurar que a atmosfera permaneça dentro de parâmetros seguros. Por fim, após a conclusão da atividade, recomenda-se a realização de uma auditoria de encerramento, registrando condições encontradas, lições aprendidas e eventuais melhorias para os próximos serviços.
Esse encadeamento cria uma linha do tempo de segurança que vai do planejamento ao pós-execução. Imagine, por exemplo, uma empresa contratante que não autoriza uma atividade ao identificar que o certificado de resgate de um trabalhador estava vencido. Ao barrar a execução, não apenas evitou um risco imediato, como também demonstrou diligência em sua fiscalização.
Em caso de fiscalização ou litígio, esse histórico comprova a adoção de medidas preventivas, reforçando a segurança jurídica da organização.
A gestão de riscos em espaços confinados exige disciplina, conhecimento técnico e integração entre contratante e prestador. Definir corretamente os espaços, cumprir responsabilidades legais, capacitar trabalhadores com base nas normas vigentes, analisar cuidadosamente a documentação e adotar boas práticas constituem um sistema robusto de prevenção.
Mais do que atender a uma exigência legal, trata-se de proteger vidas, reduzir passivos e fortalecer a imagem da empresa como agente responsável e comprometido com a segurança.
Como a Bernhoeft pode ajudar?
A Bernhoeft é uma empresa líder na Gestão de Risco com Terceiros. Contamos com uma equipe especializada, que realiza a análise e a gestão documental relacionadas à Saúde e Segurança do Trabalho. Sempre alertas às atualizações normativas, realizamos a análise documental a fim de verificar a conformidade de acordo com as legislações pertinentes. Se você busca a conformidade dos documentos dos trabalhadores terceiros com segurança, expertise e agilidade, entre em contato conosco.
Autora: Daniela Siqueira | Analista de Compliance na Gestão de Terceiros da Bernhoeft